vestiste-te e deixaste-te vestir,
moldaste-te a vários corpos,
nos tempos áureos do teu existir...
Veio os anos,
veio as modas,
e tu foste-te adaptando,
à necessidade por vezes nem sempre tua,
mas daqueles que te foram usando...
A tua textura mudou,
o tempo esse não perdoa,
a mão que outrora te afagou,
é a mesma que hoje te magoa...
Tão injusta é a vida,
tudo se rege pela vaidade,
ninguém se compadece do que é velho,
parece que tudo tem validade...
Foste sendo rasgado,
sem te puderes defender,
aquilo que foste já ninguém lembra,
apenas tu não consegues esquecer...
Não tens o mesmo vigor,
nem a beleza do passado,
mas tens tanto ou mais valor,
que aqueles que te puseram de lado...
Nunca foste dono do que é teu,
nem sequer do teu caminho,
andaste sempre à mercê,
das tesouras do destino...
Cozido a sangre frio,
por agulhas enferrujadas,
lá te foste tu curando,
da vida e das suas golpadas...
Trapo velho ou farrapo,
é o nome que te dão,
olham-te somente por fora,
ignorando que ainda tens coração...
Hoje não te veste a vida,
apenas te serve a tristeza,
estampada no teu enrugado,
cheio de sabedoria e riqueza...
Se caíres no chão,
ninguém se baixa para te erguer,
como já não cobres os ideais,
até censuram o teu sofrer...
És retrato da vergonha,
mas nele não te reconheces,
muitos sem terem molduras,
são aquilo que tu pareces...
A única coisa que pedes à vida,
é que ela se abrevie na morte,
para que pares de andar à rola,
e encontres finalmente o norte...
Que te deixem ir num sono brando,
que o fim te mostre lealdade,
já que a vida não te pagou em honra,
que seja a morte quem te ofereça a dignidade ...
*** Ártemis ***